Inglorious Brewers
Well-Known Member
Olá para todos. Resolvi abrir este tópico para podermos discutir o básico de fermentação e "maturação", tomei essa atitude pois fucei bastante no fórum e encontrei incontáveis tópicos com problemas básicos de fermentação se repetindo ad-infinitum.
Vou tentar discutir a fermentação de forma operacional, caso você queira uma discussão teórica sobre o assunto, eu escrevi esse texto aqui: Quase tudo que você precisa saber sobre leveduras e fermentação para cerveja, durante a discussão abaixo vou linkar em qual tópico do texto tem a explicação do "porquê" de fazer o indicado.
Antes de tudo quero deixar claro que fermentação correta é aquela que produz o resultado final que você deseja, logo isso é um tanto subjetivo. Porém é possível discutir métodos de se obter boas fermentações para a maioria das leveduras/estilos, é isso que pretendo fazer aqui.
0 - Leveduras Ales e Lager
Uma discussão inicial sobre esse assunto se faz necessário, pois é usual distinguir leveduras para "fazer ales" das leveduras para "fazer lager", e acabou se tornando de conhecimento comum que essas primeiras são as de alta fermentação (sacc. Cerevisiae) e as segundas são de baixa fermentação (geralmente sacc. Pastorianus). São as características das leveduras durante a fermentação que fazem elas se encaixarem em "ales" e "lagers", portanto com a evolução da biotecnologia, foi possível desenvolver leveduras s. Cerevisiae que possuem um perfil de subprodutos das fermentação muito semelhantes aos das s. Pastorianus, o que te permite fazer uma boa lager usando exatamente o mesmo perfil de fermentação que se utiliza para ales, pois você está fermentando com s. Cerevisiae. Portanto, nessa discussão vou dividir entre fermentação de s. Cerevisiae e de s. Pastorianus, tanto faz se você está fazendo ales ou lagers.
Caso 1 - s. Cervisiae
O passo inicial para começar uma boa fermentação é a hidratação da levedura por volta de 30ºC, isso não é obrigatório, mas é interessante que você o faça para garantir maior viabilidade (T.10). Garantir uma taxa de inoculação correta é importante, mas deve ser entendido o motivo correto para isso:
1 - Overpitching: Maior produção de diacetil e, em alguns casos, maior produção de ésteres indesejados. Pode haver também (Chen e Fink, 2006) produção de álcoois aromáticos que só são possíveis com alta concentração de células que induzem alterações na morfologia da levedura, o que pode não ser legal para um caso de reaproveitamento. Algumas pesquisas também mostram que uma taxa de inoculação muito alta pode consomir rapidamente óleos essenciais dos lúpulo, reduzindo o aroma final da cerveja. (T.10)
2 - Underpitching: Embora relatado pelo livro Yeast que um dos problemas principais é afetar característica de sabor e aroma da cerveja devido a variações nas concentrações de aldeídos, diacetil e baixa atenuação, as pesquisas científicas apontam que essas informações parecem não proceder. Além da baixa formação de diacetil, apenas o tempo de fermentação parece ser realmente afetado, mostrando que underpitching pode levar a um lag muito maior, o que é perigoso (Kucharczyk eTuszyński, 2015). (T.10)
Entretanto, você não terá variação da viabilidade final nem da produção de álcool com under ou overpitching. No caso de fermentações pequenas, provavelmente você note apenas diferença na velocidade da fermentação e talvez um pouco mais de ésteres/amargor ou diminuição no aroma de lúpulo, mas nada tão significativo.
Quando for fazer a inoculação da levedura não é necessário se preocupar tanto com o choque térmico da levedura se seu mosto estiver em temperatura por volta de 10 e 35ºC. A literatura acadêmica é um tanto carente de artigos que embasam os argumentos de que deve ser evitada a diferença de temperatura de 8ºC, como geralmente é citado em livros de HB. O caso das Petites Mutantis que é argumentado também carece de fontes seguras nesse âmbito. Os artigos científicos (Jenkins etal e Smart A.) são claros em afirmar que a causa das Petites são uma sucessão de fatores de stress ao longo da fermentação que levam a sua formação. Ou seja, apenas inocular no mosto com 8 ºC de diferença de temperatura não é capaz de criá-las, ainda mais que um cervejeiro caseiro não reaproveita tantas vezes assim a lama. Mas em todo caso, eu mesmo evito fazer inoculação com grande de diferença de temperatura, embora nunca tenha notado diferença quando fiz.
- Perfil de temperatura para fermentação:
* O que será dito aqui não é uma obrigatoriedade, mas é uma forma muito útil e rápida de se fazer a fermentação, com ela você evita erros e tem um "passo-a-passo" de como fazer. Exatamente o que será dito abaixo pode e é utilizado em cervejarias.
Em um caso geral você consegue uma excelente fermentação começando na faixa de temperatura indicada para a levedura, após 50% de atenuação você pode subir a temperatura para o limite máximo indicado e quando estiver faltando 10% da fermentação suba mais 2ºC e deixe terminar. Após o fim da fermentação suba gradualmente a temperatura até 25ºC para fazer o descanso do diacetil. Numa boa fermentação esse processo todo deve levar uma semana.
Para ilustrar melhor vou deixar um exemplo.
dia 1 - Temperatura de 18ºC
dia 2 - Temperatura de 18ºC ( 50% da atenuação)
dia 3 - Temperatura de 20ºC (10% da atenuação)
dia 4 - Temperatura de 22/23ºC (Fim da fermentação)
dia 5 - Temperatura de 25ºC (pode haver alguma atenuação indicando que sua fermentação estava incompleta)
dia 6 - Temperatura de 25ºC
dia 7 - Temperatura de 25ºC (nenhum diacetil notado)
Rápida explicação: Você conseguirá fazer uma boa fermentação muitas vezes mantendo uma faixa de temperatura de 18ºC até o fim do descanso do diacetil, inclusive pode ser que ela fica muito limpa no sabor e aroma. Porém algumas coisas devem ser levadas em consideração (T.11); No fim da fermentação, a levedura enfrenta bastante estresse energético e metabólico, devido a falta de açúcar fermentável e a contração de álcool no mosto, por causa disso muitas vezes sua levedura pode hibernar e o consumo da quantidade final de açúcares fermentáveis passa a ficar muito lenta (T.7), o que leva o cervejeiro a achar que a fermentação acabou e envasa dessa forma, levando muito açúcar fermentável para a garrafa. Apenas a título de ilustração, 1 SG não atenuado, corresponde a cerca de 2,6g/L de açúcar fermentável que vai para sua garrafa.
Portanto, aqui cabe a experiência: leveduras que não tem um grande potencial para produzir ésteres você pode deixá-la fermentar os últimos 10% 2ºC acima da temperatura limite, a fermentação continuará limpa, caso você esteja usando uma levedura que produza muito éster, durante os 10% finais da atenuação chegue até o limite indicado pelo fornecedor. Também deve-se atentar para a produção de diacetil, leveduras que produzem pouco são beneficiadas por esse perfil de fermentação apresentado, pois esse subproduto será rapidamente consumido. Já leveduras que produzem mais diacetil, podem demorar um pouco mais para que todo esse subproduto seja consumido, mas raramente passa de 3 dias.
O limite de 25ºC não deve produzir nenhum off flavor advindo do lúpulo (caso achem pertinente, isso pode ser discutido nos comentários) e ajuda em maior extração de óleos essenciais no caso de DH.
(continua)
Vou tentar discutir a fermentação de forma operacional, caso você queira uma discussão teórica sobre o assunto, eu escrevi esse texto aqui: Quase tudo que você precisa saber sobre leveduras e fermentação para cerveja, durante a discussão abaixo vou linkar em qual tópico do texto tem a explicação do "porquê" de fazer o indicado.
Antes de tudo quero deixar claro que fermentação correta é aquela que produz o resultado final que você deseja, logo isso é um tanto subjetivo. Porém é possível discutir métodos de se obter boas fermentações para a maioria das leveduras/estilos, é isso que pretendo fazer aqui.
0 - Leveduras Ales e Lager
Uma discussão inicial sobre esse assunto se faz necessário, pois é usual distinguir leveduras para "fazer ales" das leveduras para "fazer lager", e acabou se tornando de conhecimento comum que essas primeiras são as de alta fermentação (sacc. Cerevisiae) e as segundas são de baixa fermentação (geralmente sacc. Pastorianus). São as características das leveduras durante a fermentação que fazem elas se encaixarem em "ales" e "lagers", portanto com a evolução da biotecnologia, foi possível desenvolver leveduras s. Cerevisiae que possuem um perfil de subprodutos das fermentação muito semelhantes aos das s. Pastorianus, o que te permite fazer uma boa lager usando exatamente o mesmo perfil de fermentação que se utiliza para ales, pois você está fermentando com s. Cerevisiae. Portanto, nessa discussão vou dividir entre fermentação de s. Cerevisiae e de s. Pastorianus, tanto faz se você está fazendo ales ou lagers.
Caso 1 - s. Cervisiae
O passo inicial para começar uma boa fermentação é a hidratação da levedura por volta de 30ºC, isso não é obrigatório, mas é interessante que você o faça para garantir maior viabilidade (T.10). Garantir uma taxa de inoculação correta é importante, mas deve ser entendido o motivo correto para isso:
1 - Overpitching: Maior produção de diacetil e, em alguns casos, maior produção de ésteres indesejados. Pode haver também (Chen e Fink, 2006) produção de álcoois aromáticos que só são possíveis com alta concentração de células que induzem alterações na morfologia da levedura, o que pode não ser legal para um caso de reaproveitamento. Algumas pesquisas também mostram que uma taxa de inoculação muito alta pode consomir rapidamente óleos essenciais dos lúpulo, reduzindo o aroma final da cerveja. (T.10)
2 - Underpitching: Embora relatado pelo livro Yeast que um dos problemas principais é afetar característica de sabor e aroma da cerveja devido a variações nas concentrações de aldeídos, diacetil e baixa atenuação, as pesquisas científicas apontam que essas informações parecem não proceder. Além da baixa formação de diacetil, apenas o tempo de fermentação parece ser realmente afetado, mostrando que underpitching pode levar a um lag muito maior, o que é perigoso (Kucharczyk eTuszyński, 2015). (T.10)
Entretanto, você não terá variação da viabilidade final nem da produção de álcool com under ou overpitching. No caso de fermentações pequenas, provavelmente você note apenas diferença na velocidade da fermentação e talvez um pouco mais de ésteres/amargor ou diminuição no aroma de lúpulo, mas nada tão significativo.
Quando for fazer a inoculação da levedura não é necessário se preocupar tanto com o choque térmico da levedura se seu mosto estiver em temperatura por volta de 10 e 35ºC. A literatura acadêmica é um tanto carente de artigos que embasam os argumentos de que deve ser evitada a diferença de temperatura de 8ºC, como geralmente é citado em livros de HB. O caso das Petites Mutantis que é argumentado também carece de fontes seguras nesse âmbito. Os artigos científicos (Jenkins etal e Smart A.) são claros em afirmar que a causa das Petites são uma sucessão de fatores de stress ao longo da fermentação que levam a sua formação. Ou seja, apenas inocular no mosto com 8 ºC de diferença de temperatura não é capaz de criá-las, ainda mais que um cervejeiro caseiro não reaproveita tantas vezes assim a lama. Mas em todo caso, eu mesmo evito fazer inoculação com grande de diferença de temperatura, embora nunca tenha notado diferença quando fiz.
- Perfil de temperatura para fermentação:
* O que será dito aqui não é uma obrigatoriedade, mas é uma forma muito útil e rápida de se fazer a fermentação, com ela você evita erros e tem um "passo-a-passo" de como fazer. Exatamente o que será dito abaixo pode e é utilizado em cervejarias.
Em um caso geral você consegue uma excelente fermentação começando na faixa de temperatura indicada para a levedura, após 50% de atenuação você pode subir a temperatura para o limite máximo indicado e quando estiver faltando 10% da fermentação suba mais 2ºC e deixe terminar. Após o fim da fermentação suba gradualmente a temperatura até 25ºC para fazer o descanso do diacetil. Numa boa fermentação esse processo todo deve levar uma semana.
Para ilustrar melhor vou deixar um exemplo.
dia 1 - Temperatura de 18ºC
dia 2 - Temperatura de 18ºC ( 50% da atenuação)
dia 3 - Temperatura de 20ºC (10% da atenuação)
dia 4 - Temperatura de 22/23ºC (Fim da fermentação)
dia 5 - Temperatura de 25ºC (pode haver alguma atenuação indicando que sua fermentação estava incompleta)
dia 6 - Temperatura de 25ºC
dia 7 - Temperatura de 25ºC (nenhum diacetil notado)
Rápida explicação: Você conseguirá fazer uma boa fermentação muitas vezes mantendo uma faixa de temperatura de 18ºC até o fim do descanso do diacetil, inclusive pode ser que ela fica muito limpa no sabor e aroma. Porém algumas coisas devem ser levadas em consideração (T.11); No fim da fermentação, a levedura enfrenta bastante estresse energético e metabólico, devido a falta de açúcar fermentável e a contração de álcool no mosto, por causa disso muitas vezes sua levedura pode hibernar e o consumo da quantidade final de açúcares fermentáveis passa a ficar muito lenta (T.7), o que leva o cervejeiro a achar que a fermentação acabou e envasa dessa forma, levando muito açúcar fermentável para a garrafa. Apenas a título de ilustração, 1 SG não atenuado, corresponde a cerca de 2,6g/L de açúcar fermentável que vai para sua garrafa.
Portanto, aqui cabe a experiência: leveduras que não tem um grande potencial para produzir ésteres você pode deixá-la fermentar os últimos 10% 2ºC acima da temperatura limite, a fermentação continuará limpa, caso você esteja usando uma levedura que produza muito éster, durante os 10% finais da atenuação chegue até o limite indicado pelo fornecedor. Também deve-se atentar para a produção de diacetil, leveduras que produzem pouco são beneficiadas por esse perfil de fermentação apresentado, pois esse subproduto será rapidamente consumido. Já leveduras que produzem mais diacetil, podem demorar um pouco mais para que todo esse subproduto seja consumido, mas raramente passa de 3 dias.
O limite de 25ºC não deve produzir nenhum off flavor advindo do lúpulo (caso achem pertinente, isso pode ser discutido nos comentários) e ajuda em maior extração de óleos essenciais no caso de DH.
(continua)
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